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A amamentação de bebês com necessidades especiais

Alterações como fissura palatina, microcefalia e síndrome de Down muitas vezes dificultam que a criança consiga mamar no peito da mãe. Mas com a intervenção precoce (e uma boa dose de paciência) esses problemas podem ser contornados.

Por Luiza Monteiro
Atualizado em 26 out 2016, 21h03 - Publicado em 3 ago 2016, 17h46

Toda mulher que já teve filhos ou que está à espera de um bebê sabe (ou deveria saber) que a amamentação está longe de acontecer apenas pela intuição da mãe e do recém-nascido. Leva um tempo – e muita paciência e dedicação – até que ambos estejam habituados à rotina de aleitamento. Agora, imagine isso para uma criança que nasceu com alguma malformação neurológica ou física que torna a lactação muito mais difícil tanto para ela quanto para a mãe. Complicado, não é mesmo?

Esses pequenos e suas mamães precisam de ajuda. Mas com a atenção necessária e no tempo certo, é possível contornar as adversidades e garantir que mãe e filho disfrutem de todos os benefícios que o aleitamento materno proporciona. “Como fonoaudióloga, eu já vi e ainda vejo muitas crianças que inicialmente enfrentam dificuldades, mas que, ao serem abordadas, conseguem mamar no peito”, relata Denise Lopes Madureira, coordenadora de Fonoaudiologia do Hospital Infantil Sabará, em São Paulo.  

Conversamos com um time de especialistas para saber quais são as malformações e síndromes que mais interferem na amamentação e o que deve ser feito para garantir que esses bebezinhos consigam ingerir o alimento mais completo que existe, o leite materno. Confira a seguir:

Fissura labiopalatina

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É no primeiro trimestre de gravidez que acontece a formação do lábio e do palato, nome pomposo para o céu da boca. Mas, às vezes, fatores genéticos e ambientais – como o consumo de bebidas alcoólicas durante a gestação e a aplicação de raios X na região abdominal – impedem que essas estruturas se constituam da forma correta, e aí o bebê nasce com elas abertas. São as chamadas fissuras labiopalatinas, as anomalias congênitas mais frequentes no nosso país. “No Brasil, consideramos 1 caso a cada 650 nascimentos; no mundo, estudos apontam que a prevalência é de 1 a cada 1 mil nascimentos”, informa a fonoaudióloga Rosana Prado de Oliveira, chefe da Seção de Fonoaudiologia do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (Centrinho) da Universidade de São Paulo (USP), em Bauru, no interior paulista.

Nem sempre a fissura vai acometer o lábio e o céu da boca ao mesmo tempo: há casos em que ela ocorre apenas como uma leve cicatriz labial e situações mais graves, em que compromete, além do palato, estruturas como gengiva e até o nariz. As aberturas também podem se dar de um ou de ambos os lados da boca.

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No entanto, não são todos os pequenos que nascem com essa malformação que vão ter dificuldades para tomar o leite materno direto do peito da mãe. Segundo Rosana Prado, se apenas o lábio estiver fissurado, a amamentação em geral não fica comprometida. O problema é quando a abertura se dá no céu da boca. “O palato divide a boca e o nariz. Se ele está aberto, a criança não vai conseguir sugar com a pressão negativa necessária, ela vai ter que amassar o bico para tirar o leite”, explica a fonoaudióloga. Tudo isso torna o aleitamento muito mais difícil tanto para o bebê quanto para a mãe. Com paciência e a atenção de profissionais especializados, contudo, pode ser que dê para amamentar essa criança. Mas, se não for possível, será preciso recorrer ao auxílio da mamadeira – que também exige alguns cuidados.

Para o aleitamento dar certo

É fundamental que as mamães cujos filhos nasceram com fissura palatina recebam a orientação adequada para dar de mamar, seja no seio ou não. Uma das principais dicas diz respeito à posição em que o pequeno deve ser alimentado. “A mãe tem que estar confortável tanto pro aleitamento quanto pra oferecer a mamadeira. Mas, nos dois casos, a criança precisa estar semissentada, nunca deitada”, aconselha Prado. A recomendação visa evitar o chamado refluxo nasal, que é quando o leite volta pelo nariz. A postura mais elevada também impede que o alimento passe para o ouvido, causando otite e até perda de audição.

No caso dos baixinhos usuários da mamadeira, é importante que o bico seja macio (pode ser de silicone ou látex) e que tenha um furo que facilite a saída do líquido que está lá dentro. Durante a mamada, garanta também que o bico esteja sempre cheio de leite. “Se ele estiver com metade de leite e metade de ar, o bebê vai engolir ar, e aí pode ter cólica e mamar menos, devido à sensação de barriga cheia”, alerta a fonoaudióloga da USP.

Vale lembrar que o ideal é que o período de alimentação dure menos que 30 minutos. Depois, a indicação é colocar o bebê para arrotar – outra medida para impedir que o alimento vá aonde não deve!

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Microcefalia

ChristinLola/Thinkstock/Getty Images
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Essa malformação neurológica que faz com que o bebê nasça com um crânio menor do que o normal tem chamado a atenção do mundo inteiro devido ao surto que se deu no Brasil desde o fim de 2015. A microcefalia pode ser causada por diversos fatores além do vírus zika – outras infecções congênitas, como toxoplasmose, rubéola, sífilis, HIV e citomegalovírus também podem estar por trás do não desenvolvimento do cérebro do feto. 

E os efeitos dessa alteração não se restringem a questões cognitivas e motoras. “Muitas vezes, crianças com microcefalia são prejudicadas para mamar. Isso porque o sistema neurológico delas não está tão bem preparado e os reflexos não estão bem instalados, o que gera uma falta de coordenação entre a respiração, a deglutição e a sucção”, esclarece a fonoaudióloga Andrielle Pacheco Rubim, professora da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), em Santa Catarina.

Para o aleitamento dar certo

Sem a orientação correta, o bebê com microcefalia corre risco de aspirar o leite materno para os pulmões durante a mamada. Daí porque é fundamental que, já nos primeiros dias de vida, tanto o pequeno quanto a mamãe sejam treinados para a amamentação.

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Em relação ao recém-nascido, a principal medida é a intervenção precoce ainda na UTI neonatal, feita por uma equipe multiprofissional. “O fonoaudiólogo vai trabalhar para adequar a musculatura facial, a força, a mobilidade e a sensibilidade desse bebê a fim de que ele consiga fazer a sucção”, diz Pacheco. Segundo ela, é comum que essas crianças precisem se alimentar por sonda no começo. Mas, com a terapia, a tendência é que se tornem aptas a mamar no peito.

A mamãe também precisa de cuidados especiais. “Ao saber que teve um filho com microcefalia, ela pode ter dificuldade para produzir o leite. É muito importante que essa notícia seja trabalhada de forma tranquila”, propõe a fisioterapeuta Elaine Leonezi Guimarães, professora do curso de Fisioterapia da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM).

Quanto à posição para amamentar, é importante saber que não há uma regra específica. “O bebê precisa estar voltado para o corpo da mãe, com a sustentação do quadril adequada, de forma que a boca permaneça na altura do mamilo e da aréola”, ensina Guimarães. Se notar que o seu filho está com alguma dificuldade, converse com a equipe que o está acompanhando para saber se há alguma correção a ser feita ou se será necessário recorrer a outras vias de alimentação.   

Síndrome de Down

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Aqui, não estamos falando de nenhuma malformação ou deficiência, apenas de uma alteração genética, que não impede o crescimento e o desenvolvimento saudável da criança. No entanto, é comum que os pequenos com síndrome de Down tenham a chamada hipotonia muscular global, que é a flacidez da musculatura de todo o corpo. E quando se trata da amamentação, isso pode ser uma complicação. “Esses pacientes têm a hipotonia da língua, que fica maior, mais mole e, muitas vezes, para fora da boca, gerando dificuldades nos reflexos orais”, pontua a professora da UFTM.

Para o aleitamento dar certo

Nessa caso, a solução é, mais uma vez, a intervenção precoce junto a um time de profissionais de diferentes áreas. “São feitos exercícios que estimulam o movimento que essa criança precisa fazer para mamar. Eles podem ser realizados com pedaços de algodão ou com uma esponja, por exemplo”, conta Elaine Leonezi Guimães. “Também é importante estimular a língua para que ela desencadeie o movimento de sucção”, lembra a fisioterapeuta. Inclusive, no caso das crianças com Down, a amamentação em si já é um tipo de exercício. “Ao mamar, elas vão fortalecer a musculatura e estar melhor preparadas para a fase da introdução dos sólidos“, destaca Andrielle Pacheco.  

As recomendações para o posicionamento na hora da amamentação não são rígidas. É importante assegurar que mãe e filho estejam confortáveis e, principalmente, que o bebê não está aspirando o leite para os pulmões. O fortalecimento da musculatura da cabeça, do pescoço e do abdômen a partir de exercícios fisioterápicos também vai ajudar na hora das mamadas, dando força e sustentação para que o pequeno consiga mamar com segurança e da forma correta.

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