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Diálogos de uma Mãe Solo

Tainá Goulart (@tainagoulart) é jornalista, cantora, mãe solo do Francisco e filha da dona Laura, também mãe solo.
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O papel da mãe solo dentro do conceito de “pai e mãe”

Em determinado momento, Tainá Goulart começou a sentir que estava representando a figura paterna para o filho. Como assim? Leia a reflexão dela

Por Tainá Goulart
8 set 2023, 14h00
mulher e garoto sentados no chão. Eles se olham com ternura e estão com as testas encostadas
 (AleksandarNakic/Getty Images)
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Como ficam as atribuições “tradicionais” da parentalidade quando se tem apenas uma das duas figuras dessa dinâmica? É preciso se encontrar primeiro, para depois entender o seu protagonismo nesse cenário.

Para a dona Laura, ser chamada de “pãe” (pai + mãe) traz felicidade, sensação de vitória, orgulho. Quando eu nasci, era essa palavra que ela usava para descrever sua maternidade solo e se apropriar dela, algo que faz até hoje. No meu caso, até os 20 anos, também me orgulhava de ser filha de uma “pãe”, que assumiu diversos papéis para si e criou sozinha uma menina.

No entanto, com o meu amadurecimento como mulher dentro de uma sociedade em mudança (ou pelo menos em processo vagaroso de…), passei a não adotar esse título, pois, ao meu ver, desmerece quem só quer exercer bem uma função dentro da parentalidade. Falo isso, com 33 anos recém-completos, pois esse tende a ser o pensamento da minha geração, que vem transformando e ressignificando a maternidade solo, cada uma da sua maneira.

Tudo mudou com a chegada do Francisco. O maior dos clichês? Com toda certeza, afinal, agora sou a mãe que cria o filho sozinha, que faz múltiplos papéis dentro do conceito hegemônico de família. E é aqui que começa minha reflexão sobre como, nos últimos tempos, acabei me sentido como pai do Francisco, enquanto minha mãe seria a mãe dele.

Espera, não entendi… Você, mãe solo, é o pai?

Nem eu mesma estava conseguindo entender. Por ser a pessoa que trabalha, que pagas as principais contas do Francisco, que sai para comprar mantimentos, que passa “pouco” tempo com o filho e por vários outros pensamentos, comecei a entrar na nóia de que eu estava virando o pai da minha maternidade solo. E minha mãe, que já é aposentada e não tem muito o hábito de sair, foi do script de avó para o de mãe – já que estava ficando com o meu filho, dando banho, brincando, oferecendo algumas madeiras…

Essa sensação passou a pegar mais com a introdução alimentar. Faltava tempo para dar a comidinha do Francisco, por conta dos horários dele e das minhas demandas do trabalho. “Mas, gente, que loucura! Não pensa assim, não”, minhas amigas falaram. Até tentei me desvencilhar dessa concepção, porém, em uma conversa com a minha terapeuta, as coisas ficaram mais claras.

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colagens de uma mesma mulher grávida e em momentos de carinho com um bebê
Tainá Goulart e a família (Arte: Anamaria Sabino | Fotos/Arquivo Pessoal)

Os papéis podem até bater com “tradicional”, mas…

Na sessão, desabafei para a especialista, falando sobre o peso de carregar o que a sociedade entende como paternidade nas costas e sobre como eu me sentia menos mãe por não dar comida todos os dias, por não dar a devida atenção para as brincadeiras, por não estimular Francisco a engatinhar sempre.

Dialogando, a terapeuta me fez refletir sobre as tarefas atribuídas às figuras de pai e de mãe pela sociedade, como a pessoa que sai para trabalhar e a outra que fica em casa. Porém estamos mudando, mesmo que bem aos poucos, essas divisões e cada maternidade, paternidade e parentalidade é única. Quantos casais estão dividindo melhor quem faz o quê? Quantos se mantêm no tradicional? Quantas mães solo seguem seu caminho, com e sem ajuda do progenitor? Quantos casais homoafetivos assumem, cada um, um papel na criação, independentemente de gênero?

Além dessa consciência de ressignificação no cenário macro, eu precisava me empoderar do meu papel de protagonista. Eu sou mãe solo do meu jeito, com a minha narrativa, e é necessário estar ciente das minhas escolhas e de suas respectivas consequências. É entender que, para eu estar bem como um todo e criar o Francisco da melhor maneira possível (ao meu ver, claro), preciso trabalhar, estar em movimento e fazer com que o tempo com ele seja de qualidade e não de quantidade. Assim como “dividir” o menino com a minha mãe, em seu papel de avó, que tem suas vontades e sonhos nesse lugar novo.

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Qual é o termo que teremos no futuro?

Para finalizar, a terapeuta fez um comentário pertinente sobre o futuro das maternidades e o que o meu filho vai encontrar na sala de aula. Seus coleguinhas virão de núcleos familiares distintos, múltiplos, únicos e com narrativas infinitas.

“Ele vai ter uma outra visão sobre você e o seu maternar, e isso é positivo. Você entende suas necessidades e os outros papéis que exerce, e está fazendo o seu melhor para equilibrá-los. Só de tentar, já vai ser um exemplo interessante para o seu filho refletir. Porém, como ele vai juntar as bagagens de casa com as do mundo ao seu redor, nós não temos controle”, disse ela.

E que bom que não temos controle, né? Como sou apaixonada por música, fica aqui a comparação: a nossa vida (e isso inclui a maternidade) é como uma jam session, um show de Jazz, gênero musical que tem o improviso como um dos grandes destaques. Todos da “banda” são craques, sabem tocar seus instrumentos como ninguém. No entanto, o Jazz só é o Jazz quando cada universo dos integrantes colide, criando algo sem precedentes, em uma sintonia perfeita. Ou seja, só nós sabemos como improvisar em nosso conceito de parentalidade, porém, precisamos nos apropriar dessa confiança da técnica, do feeling, para saber como encarar o inesperado e tirar de letra, dando boas risadas ao final do show.

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