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Dificuldades na fala da criança: quando procurar um fonoaudiólogo?

Especialistas explicam o que esperar em cada fase, como estimular o pequeno e os sinais a que os pais e cuidadores devem estar atentos

Por Manuela Macagnan
Atualizado em 6 set 2023, 12h48 - Publicado em 8 dez 2021, 16h10
Filho-conversando-com-a-mãe
 (Catherine Falls Commercial/Getty Images)
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O choro é a primeira forma de comunicação do bebê. É por meio dele que a criança demonstra se está com fome, com dor ou incomodada com alguma coisa. Com o amadurecimento, o pequeno vai desenvolvendo a fala como se estivesse subindo os degraus de uma escada e, a cada semana, vão aparecendo palavras, sons novos e as frases vão ficando cada vez mais estruturadas. 

O mais importante para ajudar no desenvolvimento da fala e linguagem, é manter uma conexão com a criança: apresentar o mundo e sempre lembrar que, o que parece óbvio para nós, para uma criança em desenvolvimento não é. Por exemplo, quando tomamos um suco de laranja, sabemos do que se trata, a criança precisa ser ensinada que é um “suco”, que é para “tomar”, que foi feito com “laranjas”. Precisamos mostrar, nomear, explicar as funções, fazer descrições, tudo com calma e paciência. As crianças precisam de repetição, precisam que falemos devagar, olhando para elas e que estejamos verdadeiramente conectadas ao momento.

Mas como saber se a criança está no tempo certo do desenvolvimento da fala? Para responder a esta e outras perguntas sobre o tema, conversamos com duas fonoaudiólogas que explicam o que esperar em cada fase, como estimular a criança a falar e os sinais a que os pais e cuidadores devem estar atentos.

Como ajudar a criança a desenvolver a fala?

Tenha em mente que as crianças aprendem quando se divertem e não quando são demasiadamente cobradas, então brincar é uma excelente forma de desenvolver a fala. “Ao brincar estamos estimulando o conhecimento dos objetos, estamos representando o mundo pelos brinquedos, mostrando como usá-los. Nas brincadeiras, têm sons, imitação, sequências. Por exemplo, pegamos um caminhão, colocamos um cavalo em cima e saímos para passear – é uma sequência de ações. Na fala, é uma sequência de sons, que se juntam para formar sílabas, que por sua vez, se unem para formar palavras e frases”, ensina a fonoaudióloga Elisabete Giusti.

Ler histórias é uma outra forma excelente de estimulação. Procure historinhas curtas, com figuras bem definidas, imite as vozes dos personagens, envolva a criança, faça suspense, deixe ela imaginar o que virá. As músicas também são ótimas ferramentas para estimular a fala e a conexão com o filho ou filha. 

Pai e filha lendo livro

“Todas essas formas de ajudar, precisam ser leves, lúdicas, com entrega, sem cobranças, sem excesso de perguntas, sem ficar checando o que a criança sabe ou não”, alerta Elisabete.

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A fonoaudióloga Jessica Costa Lopes Brito, do Espaço Ciranda, em Brasília, complementa que também é importante “gesticular e expressar com a face sentimentos e emoções, nomear objetos, ações e expor a criança a experiências de brincadeiras e ambiente diversos”. Lembre-se também de narrar o que irá acontecer, vibrando com as tentativas e evitando usar palavras no diminutivo.

Quando os pais devem se preocupar que a criança não fala direito?

Cada criança tem seu tempo e é preciso respeitá-lo, sem tantas comparações com outros pequenos. No entanto, o desenvolvimento da fala possui marcos e é importante estar atentos à eles (veja no quadro abaixo). “Quando os pais perceberem que a criança apresenta dificuldade em ser compreendida por eles ou por pessoas fora do convívio natural e cotidiano da criança, necessitando ser ‘traduzida’ ou solicitada repetição para compreensão, então é indicado buscar ajuda”, define Jessica.

Atente se o pequeno tem progresso nessas etapas. “Os primeiros sons que a criança aprende são as vogais, depois as consoantes “P”, “M”, “B” que são mais visíveis e menos complexas e, gradativamente, vai aumentando seu repertório de consoantes, de sílabas e a fala vai ficando cada vez mais clara. Aos 3 anos, uma criança já apresenta cerca de 75% de inteligibilidade de fala, ou seja, as pessoas já conseguem entender praticamente tudo o que ela fala”, explica Elisabete.

Alguns sons são mais complexos e serão adquiridos mais tarde um pouquinho, como é o caso do “R” e do “L” em encontros consonantais (ex; PRato – CLube – FLauta), dos arquifonemas como,  EScola – pAStel – pORco, que serão adquiridos, por volta dos 5 a 6 anos de idade”,

Etapas do desenvolvimento da fala

– Até os 3 meses: são esperadas emissões de sons e atenção aos ruídos do ambiente, riso, conforto e calma ao ouvir vozes familiares.
– De 3 a 6 meses: iniciam-se os balbucios (com prolongamento de vogais), apresenta o sorriso social, faz contato visual com o interlocutor, localiza os sons no ambiente, segue com o olhar as pessoas e objetos, diverte-se com as brincadeiras de mímica facial, mudança de voz e sons diferentes emitidos pelas pessoas.
– De 6 a 9 meses: iniciam o balbucio de consoante + vogal, tenta imitar ações e sons executados pelo interlocutor, começo da compreensão de algumas palavras e frases curtas, vinculação do contato visual e vocalização para trocas comunicativas.
– De 9 a 10 meses: a criança aponta para sinalizar e mostrar algo, imita os sons de animais, segue instruções curtas e produz mais balbucios diversificados.
– De 12 a 15 meses: surgem as primeiras palavras como “dá”, “não”, “sim”, “papai”, “mamãe” – que podem sofrer variações como “mamã” -, imita ações dos adultos como dar “tchau”, utiliza gestos comunicativos e o balbucio apresenta entonação.
– De 15 a 18 meses: fala aproximadamente 50 palavras, aponta partes do corpo quando lhe é solicitado, responde com afirmação ou negação tanto por meio da fala quanto com o movimento de cabeça e emite frases com duas palavras, como: “me dá” e “vem aqui”.
– De 18 e 24 meses: a criança fala cerca de 200 palavras, escolhe e expressa por meio da fala quando lhe são dadas duas opções, cantam e entoam músicas curtas.
– Aos 3 anos: ocorre uma explosão do desenvolvimento gramatical, as crianças, já começam a usar pronomes, responder pequenas perguntas, usar frases mais longas e, quanto à clareza e inteligibilidade de fala, espera-se que seja, por volta de 75%, ou seja, já é possível entender praticamente tudo o que a criança quer expressar.
– Aos 4 anos: brinca de faz de conta, narra seu cotidiano e entende regras de jogos sem muita complexidade. 
– Aos 5 anos: já temos um “miniadulto” em termos de comunicação, as crianças já conversam, relatam fatos, contam o que fizeram em um passeio e já conseguem se engajar e manter uma conversa com os adultos.

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Com quantos anos é esperado que a criança já saiba falar corretamente?

Não existe uma idade ideal para buscar ajuda, como por exemplo, achar que a criança é muito nova e esperar até tal idade. Sempre que houver qualquer suspeita ou dúvida que o desenvolvimento não está ocorrendo da forma esperada, procure um profissional para uma orientação adequada. “Para as crianças, que apresentam algum tipo de transtorno de fala esperar pode ser muito prejudicial”, conclui Elisabete.

De acordo com as fonoaudiólogas, até os 5 anos é esperado que a criança emita todos os fonemas, ou seja, todos os sons da fala. No entanto, fique atento e, se a criança não está progredindo conforme o esperado, busque ajuda.

Quais são os prejuízos para a criança que fala errado e os pais não buscam ajuda profissional?

Falar errado pode impactar em vários aspectos do desenvolvimento da criança, já que é importante para a interação e trocas sociais. “Os prejuízos que podem acarretar a falta de atenção voltada à fala da criança incluem comportamentos de inibição diante da troca social, irritabilidade, insegurança e pouca intenção de interação. Por isso, as crianças com atraso de fala necessitam de avaliação e intervenção fonoaudiológica o quanto antes”, salienta Jessica.

A fonoaudióloga Elisabete complementa: “Falar errado poderá prejudicar também o processo de alfabetização, o desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita, pois as trocas e omissões de sons na fala, poderão ser transpostos para a escrita e leitura. Uma fala desorganizada, poderá atrapalhar o comportamento e as ações da criança”.

Quando o pequeno fala errado, os pais devem corrigir?

É importante lembrarmos que as crianças estão em fase de desenvolvimento, por isso precisam de modelos corretos de fala. “Os pais devem corrigir, mas essa correção não deve ser rígida, num tom de cobrança ou até mesmo ridicularizando o filho. O correto é, quando a criança falar algo errado, que o adulto retome o que ela disse, dando o modelo adequado, falando mais devagar, dando ênfase na sílaba que foi pronunciada errada”, ensina Elisabete. 

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Por exemplo, se o filho ou filha disser – “eu quero tuco” – repetir – “SUco, você quer SUco? Prolongar um pouco o som também ajuda, mas não se deve repetir o erro da criança. “Valorize todas as formas de comunicação, que pode ser com gestos, com expressões faciais, mímicas e até mesmo por pelo olhar”, diz a especialista. 

E quando são palavras fofinhas que saem errado, tudo bem deixar passar?

Bebê e homem sorrindo cara a cara
(dusanpetkovic/Getty Images)

A gente se diverte com algumas palavras que os pequenos falam errado ou até inventam, mas não devemos estimular estes erros.

“Procure expressar seu carinho e amor de outras formas: abraçando, beijando, sorrindo, brincando e estar sempre conectado à sua criança. Apesar de ser até bonitinho, foque sempre em dar os modelos corretos. Elas se beneficiam muito de toda musicalidade que usamos na nossa fala, diferentes tipos de vozes, de entonações, de expressões e isso poderá sempre ser usado, mas quando se tratar da pronúncia opte sempre pela forma certa”, enfatiza Elisabete.

Como funciona o tratamento com fonoaudiólogos?

Existem diferentes tipos e níveis de gravidade de transtornos que acometem a fala, por isso, a busca por uma ajuda especializada é fundamental. O diagnóstico precoce e diferencial destes transtornos é muito importante.

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“Temos diferentes abordagens terapêuticas e é importante que o profissional sempre analise, com cuidado, qual é a melhor para cada criança, para que sejam elaborados planejamentos terapêuticos específicos, que respeitem a individualidade de cada um, e que sejam efetivos”, explica Elisabete.

O que pode atrapalhar a fala da criança?

O desenvolvimento da fala parece algo natural do desenvolvimento de toda criança, mas não é. Os adultos têm um papel essencial nesse processo. A fonoaudióloga Elisabete elenca algumas atitudes que atrapalham:

  • Ambiente pobre em comunicação. Pais muito ocupados e que não conseguem, no dia a dia, estabelecer uma rotina de conversa, de apresentação do mundo para a criança. 
  • Falar de forma infantilizada, usando muitos diminutivos ou até mesmo pronunciar as palavras de forma errada. Lembrem-se que as crianças precisam de modelos adequados e elas estão o tempo todo ouvindo o que estamos dizendo e isso ajuda nos registros de memórias dos sons e palavras. 
  • Se falar pouco é prejudicial, falar demais também é. Dar muitas informações ao mesmo tempo, falar rápido demais, falar pela criança, completar a fala dela, não criar espaços para que ela possa se arriscar para a comunicação. Ambientes comunicativos competitivos não otimizam as oportunidades de comunicação da criança. 
  • Perguntas excessivas, ficar checando o conhecimento da criança. Ensinar apenas cores, números e letras. Lembre-se que o vocabulário vai muito além. 
  •  Outro aspecto bem atual e que afeta o desenvolvimento da fala, é a exposição precoce e prolongada às telas. Os pequenos ficam muito passivos diante de tablets e celulares e a fala, para se desenvolver, depende das trocas entre as crianças e os adultos, depende de ambientes estruturados e organizados, principalmente em termos de atitudes comunicativas. Interagir com os filhos é fundamental. 

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