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“Como eu procuro passar os mesmos valores para a minha filha e o meu filho”

Conheça a história de uma mãe que ensina os pequenos a respeitar a igualdade de gênero.

Por Luísa Massa
Atualizado em 28 out 2016, 17h42 - Publicado em 2 mar 2016, 07h00
Rachel Guedes
Lidando com o mau cheiro nas axilas durante a puberdade das crianças (Rachel Guedes/Pinterest)
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Loreta Berezutchi, 32 anos, é mãe do Pedro, de 8 anos, e da Catarina, de 6 anos, publicitária e idealizadora do blog Bagagem de Mãe. Aqui, ela fala sobre a tarefa de educar os filhos da mesma maneira em uma sociedade que ainda cultiva valores machistas. 

“Antes de ter o Pedro, eu sofri abortos espontâneos e perdi dois bebês. Foi muito difícil e sofrido. Quando finalmente engravidei, a única coisa que queria era que o meu filho tivesse muita saúde e que ele aguentasse o tempo necessário dentro da minha barriga para que eu pudesse realizar o sonho de ser mãe.

Eu não tinha preferência de sexo, só desejava que a criança chegasse bem ao mundo, mas quando descobri que estava esperando um menino, senti um alívio e aquilo me assustou. Foi a primeira vez que eu percebi que, ao contrário do que eu dizia para mim mesma, eu tinha, sim, uma preferência. Não pelo fato de não querer uma garotinha, mas porque simplesmente tinha MEDO de ser mãe de menina porque eu sei que ser mulher nessa sociedade não é fácil.

Todos os dias enfrentamos batalhas – desde as coisas que parecem ser mais simples, como sermos respeitadas ao caminharmos na rua, até as mais sérias, como conquistarmos nosso espaço no trabalho e termos os direitos assegurados. Por isso, eu ficava aterrorizada com a ideia de colocar uma menina no mundo ‘para sofrer’. Então, senti um imenso alívio em pensar que o meu bebê, pelo simples motivo de nascer menino, já seria privilegiado.

Sim, eu senti isso, mas não era certo e eu me culpei por ter esses pensamentos. Não sabia se estava sendo realista, dramática, preconceituosa… Eu só tinha a certeza de que precisava fazer algo para mudar a situação, pois o meu bebê era homem, mas outras mulheres também estavam nascendo e esta não é a realidade que eu desejo para o meu filho e nem para o filho de ninguém!

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Foi aí que eu percebi que ser mãe de menino era ter a oportunidade de criar um homem diferente, que eu gostaria de encontrar por aí por ser uma pessoa bonita, justa, solidária e sem preconceitos. Se você acha que educar uma criança dá muito trabalho, imagina criar um filho fugindo dos padrões e regras impostas pela sociedade! É esforço dobrado e tudo começou ainda no enxoval. Toda loja que entrava, a primeira pergunta que ouvia da vendedora era: ‘é menino ou menina?’. Aquilo me irritou tanto que eu decidi que o enxoval do pequeno não seria rotulado como ‘de menino’. Fugi do azul, dos carros, bolas, esportes radicais e optei por peças neutras e coloridas. Foi um desafio achar lojas que respeitassem a igualdade de gêneros.

Eu só pensava em como poderia criar um homem diferente se a nossa sociedade faz tudo para rotular, enquadrar e encaixar de maneira superficial e misógina. Confesso que fiquei bitolada e radicalizei. Blindei a minha casa e o meu filho de todas as influências machistas. Eu tinha um plano: conseguir fazer o Pedro crescer sem pensar que ele era obrigado a gostar de futebol, que rosa era cor de menina e que os meninos brincavam de carrinhos e não de bonecas, que eles não podiam chorar e por aí vai.

Tudo ia bem, até eu engravidar de novo. Dessa vez no susto, sem planejar. Quando descobri que era uma menina, me desesperei! Eu imaginava uma linda garotinha, sapeca e sorridente, mas em seguida pensava em como ela precisaria se defender todos os dias e chorava! Só consegui aceitar a gestação e ficar feliz com a notícia quando já estava com quase seis meses. Tem dias que eu me lembro disso e me sinto culpada por ter demorado tanto para amar a Catarina, mas então eu me lembro de que não foi falta de afeto, mas medo!

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Com o nascimento da Cacá, eu percebi que a minha estratégia de ‘blindar’ a casa e as crianças estava equivocada. Por mais que eu idealizasse um mundo sem preconceitos, a verdade é que, na prática, somos atacadas todos os dias de diferentes formas. Então, como vencer essa guerra? Percebi que a melhor maneira de proteger os meus ideais e seguir em frente no tipo de educação que eu quero dar para os meus filhos é fazendo escolhas conscientes, sendo o exemplo e ensinando-os a pensar.

Ser mãe de um casal é ter dentro de casa um menino e uma menina ‘novinhos em folha’ para ensiná-los a lidar com as suas diferenças biológicas, mas sem heranças culturais preconceituosas. O Pedro tem carrinhos, ama super-heróis, a Cacá tem bonecas, adora as princesas e está tudo certo. Além disso, eles são companheiros e desde sempre brincam de tudo: casinha, piratas, heróis, bonecos. Para mim, o errado é as crianças acharem que elas só podem gostar de determinadas cores ou brincadeiras porque pertencem a um gênero específico.

Hoje eles têm praticamente as mesmas liberdades e responsabilidades dentro de casa. A única coisa que os diferencia é a faixa etária. Por exemplo, o Pedro lava louça e a Cacá ainda não porque tenho medo de que ela se machuque, mas os dois devem recolher os brinquedos e sapatos, levar os pratos para a cozinha após comer, ajudar quando eu pedir. Da mesma forma em que tanto ele quanto ela podem andar descalçados, subir em árvores, sujar a roupa, ficar descabelados. Aqui, nunca teve esse papo de que ‘isso é coisa de menina ou de menino’, mas é claro que nós sofremos interferências externas.

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O Pedro está em uma fase em que ele se preocupa mais com a aceitação dos amigos da escola. Isso significa que, muitas vezes, ele sublima os próprios sentimentos e ideais para pertencer ao seu grupinho. E qual é o meu papel nisso? Insistir em provar que ele é muito mais legal por ser ele mesmo, que ser original é o que faz as pessoas o amarem e respeitarem e que ele não precisa de amigos que o façam se sentir inferior. O trabalho é duro, mas eu faço com todo cuidado e amor!

A Cacá está crescendo e é uma menina linda, inteligente, sorridente e espirituosa. Nesse momento, vivo o dilema de ensiná-la sobre se defender dos ‘homens lá fora’ ou deixar que ela cresça livre e que esta liberdade seja a sua maior fortaleza. Não é fácil, pois a vida grita na nossa cara todos os dias e persiste em nos fazer desistir, mas eu não aceito. Se eu disser que esta é uma questão completamente bem resolvida, estarei mentindo. Apesar de estar segura e saber que eu estou fazendo a minha parte, ainda tenho medo do que ela vai encontrar por aí e é este receio que me faz insistir em fazer um bom trabalho como mãe de menino, de menina e, acima de tudo, de pessoas íntegras“.

 

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