Apesar de ser um dos contraceptivos mais efetivos e com poucos efeitos colaterais, o dispositivo intrauterino, conhecido como DIU, tem uma taxa baixa de uso no Brasil. Segundo um levantamento do Instituto Ipsos, 58% do público feminino prefere a pílula, enquanto apenas 8% disseram optar pelo DIU. A desinformação e os mitos são algumas das principais razões da impopularidade. De acordo com um estudo da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP), o interesse em usar o método é maior entre mulheres mais jovens, com nível de escolaridade mais alto, com plano de saúde, solteiras, sem filhos e com um repertório maior sobre o tema. É importante, portanto, desmistificar o assunto para ampliar seu alcance.
Pensando nisso, pedimos ajuda à ginecologista e obstetra Victória Gontijo, focada em pré-concepção, pré-natal, parto e pós-parto, da clínica de saúde da mulher gestante Theia (SP), para entender melhor o que é o DIU e como ele funciona: “O dispositivo intrauterino é um método de contracepção reversível de alta eficácia e longa duração, com relativamente poucas contraindicações”, explica. Trata-se de um pequeno objeto em forma de “T”, que, colocado no útero, não impede a ovulação, mas produz efeitos que impossibilitam a gravidez.
DIU hormonal x DIU não hormonal: as diferenças
Existem diferentes tipos de DIU e eles podem ser divididos entre os que agem sem ou com hormônios. “O DIU hormonal tem ação principalmente no muco do colo uterino, dificultando a ascensão dos espermatozoides para dentro do útero. Já o DIU não hormonal age com uma reação local dentro do útero, que possui efeito tóxico para os espermatozoides”, diz a médica.
A versão hormonal (conhecida no mercado com nomes como DIU Mirena e DIU Kyleena) libera, localmente e de forma controlada, um hormônio chamado levonorgestrel, que torna o muco cervical mais espesso, o que impede a passagem dos espermatozoides. Além disso, dificulta o crescimento do endométrio, que é o revestimento interno do útero, onde o embrião se fixaria para o desenvolvimento de uma possível gestação. Sua eficácia é um pouco maior, de 99,8%.
A opção não hormonal, o DIU de cobre – material que altera os gametas femininos e masculinos, e inibe as enzimas do endométrio, diminuindo a mobilidade dos espermatozoides – também conta com uma taxa alta de sucesso na contracepção, de 99,2%.
Uma das maiores vantagens é que, depois de colocado, você não precisa se lembrar de “usá-lo” (é muito comum, por exemplo, que as mulheres se esqueçam de tomar a pílula nos dias corretos, o que causa falhas na contracepção). Vale ressaltar que o DIU hormonal tem efetividade por cerca de 5 anos. Já o de cobre, por até 10 anos. Depois desse período, Victória alerta que é preciso substituir o dispositivo.
Há ainda outra versão do DIU de cobre que também tem prata na composição. O mecanismo de ação é o mesmo. “A prata foi inserida para levar mais estabilidade ao cobre e evitar que ele se fragmente”, conta a especialista. “Foi uma tentativa de reduzir os efeitos adversos do DIU de cobre, sobretudo o aumento de cólicas e do fluxo sanguíneo que pode ocorrer nos primeiros ciclos, após a inserção. No entanto, ainda são necessários mais estudos para que tenhamos a certeza da superioridade do DIU de prata em relação ao DIU apenas de cobre”, acrescenta.
Efeitos colaterais: DIU engorda?
Um dos mitos sobre os efeitos colaterais causados pelo DIU é de que ele teria influência no aumento do peso corporal. Uma revisão de várias pesquisas científicas sobre o assunto, feita pelo Centro Nacional de Colaboração para a Saúde da Mulher e da Criança, nos Estados Unidos, não encontrou nenhuma evidência de associação entre as duas coisas. “O uso do DIU não mostrou relação com ganho de peso, independentemente do tipo”, diz a ginecologista.
Outro ponto que acaba gerando confusão acerca do tema é a afirmação de que o método só é indicado para mulheres que não desejam mais ter filhos, já que prejudicaria a fertilidade. Isso também não é verdadeiro. Nem o DIU de cobre, nem o hormonal interferem na ovulação. Portanto, teoricamente, no primeiro mês após a retirada do dispositivo, se você tiver relações sexuais, os espermatozoides já estarão com o caminho livre para encontrar os óvulos e fertilizá-los. Estudos científicos demonstraram que entre 80 e 90% dos casais conseguem engravidar em até um ano após a remoção do DIU. “Assim que decidir iniciar as tentativas de gestar, a mulher pode solicitar a retirada ao médico. O ideal é passar antes em consulta pré-concepcional”, recomenda Victória.
E a menstruação?
Ela pode ou não sofrer impactos, dependendo da mulher. “O DIU não hormonal costuma influenciar menos nisso. Por vezes, pode até aumentar um pouco o fluxo e as cólicas, especialmente nos primeiros meses. Já o DIU hormonal tem efeito diferente: muitas vezes, atua reduzindo o fluxo sanguíneo e as cólicas, podendo levar até a um longo período sem nenhum sangramento”, explica a médica.
O uso de DIU traz riscos?
De acordo com a ginecologista, há chances de acontecerem intercorrências, porém elas são raras. “Na inserção, existe um risco pequeno de perfuração do útero (1 em cada mil inserções). No entanto, ele é reduzido quando o procedimento é realizado cuidadosamente e com a técnica adequada”, exemplifica.
Como o DIU é colocado?
Justamente para minimizar as chances de ocorrências como perfuração ou mau posicionamento, a inserção do DIU deve ser feita por um médico especializado. “É um procedimento simples, que pode ser feito no consultório”, diz Victória. “Um espéculo é inserido na vagina, é realizada uma limpeza da região, o colo do útero é visualizado e pinçado. Em seguida, o profissional faz uma medida do útero e, então, insere o DIU pelo colo do útero. Por último, o fio é cortado”, detalha.
Esse fio é uma parte que fica de 1 a 2 centímetros para fora do útero, na vagina. “Não é preciso realizar ultrassom depois. Basta fazer o exame ginecológico e visualizar o fio do DIU no local, como acompanhamento rotineiro”, indica.
É possível colocar o dispositivo em qualquer momento da vida da mulher, inclusive imediatamente após o parto. Após a inserção, não é necessário repouso e a paciente pode retornar às atividades cotidianas normalmente. O Ministério da Saúde recomenda que, durante os primeiros sete dias, se tiver relações, a pessoa utilize outros métodos, como preservativos, já que é um período de adaptação do organismo.
Toda mulher pode usar DIU?
As contraindicações são poucas. De acordo com a Victória, as mulheres que não podem usar DIU são aquelas que apresentam alguma condição, como miomas, que podem alterar a cavidade interna do útero e dificultar a inserção.
Caso a paciente tenha alguma anomalia estrutural que modifique o formato do útero, se tiver câncer de colo de útero, uma infecção grave ou se manifestar alergia a cobre (no caso do DIU de cobre) ou alergia ao levonorgestrel (no caso do DIU hormonal), o uso também não é recomendado. Tudo isso deve ser avaliado pelo médico.
Quanto custa colocar DIU?
A colocação do DIU de cobre é oferecida gratuitamente na rede pública de saúde. Basta procurar a UBS mais próxima à sua casa, com atendimento de ginecologia, para marcar uma consulta e o procedimento, pós-avaliação. Em geral, os médicos do SUS recomendam que a mulher participe de grupos de planejamento familiar antes, para entender melhor quais são os métodos contraceptivos existentes e as vantagens e desvantagens de cada um, antes de escolher o melhor para ela – embora isso seja opcional.
Planos de saúde também costumam ter cobertura. “Os valores particulares variam muito, porém, o preço do DIU hormonal é superior ao do DIU de cobre ou de cobre com prata”, diz a especialista. Em média, as versões de cobre e de cobre com prata custam entre R$ 150 e R$ 500. Já os hormonais custam entre R$ 800 e R$ 1300, aproximadamente. Além disso, há o valor dos honorários médicos.