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A expectativa do parto normal

Conheça a história da mãe que queria parir naturalmente e, apesar de ter feito tudo o que estava ao seu alcance, deu à luz por meio de uma cesárea.

Por Luísa Massa
Atualizado em 24 Maio 2017, 18h46 - Publicado em 4 jul 2016, 09h20
Arquivo pessoal
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Alice Schultes, 35 anos, é mãe do Joaquim, de 1 ano, ginecologista e obstetra e idealizadora do Instagram Obstetra Grávida. Aqui, ela conta a sua história e fala sobre a expectativa do parto normal, que não aconteceu.

“Eu sempre soube que queria ser obstetra. Entrei na faculdade de medicina com o objetivo de sair de lá ginecologista e obstetra, mas as coisas não aconteceram dessa maneira com a maternidade, pois eu achava que não queria ser mãe. Inclusive, quando conheci o meu marido, isso foi um ponto que eu abordei logo de cara e disse para ele que não queria ter filhos. Ele entendeu e falou que estava tudo bem.

Durante a residência médica, tive um professor que é um grande nome da reprodução humana no Brasil. Ele tem uma clínica aqui no Espírito Santo e eu comecei a acompanhar o seu trabalho. Um dia, conversando com ele, mencionei que não queria ser mãe e ele comentou que eu iria me arrepender dessa decisão. Eu discordei: “não vou não. Já tenho 32 anos, sou casada há seis anos e não queremos filhos”. Ele continuava insistindo que eu me arrependeria e falou que eu deveria estimular os meus ovários e congelar os óvulos porque se eu tivesse vontade de ter um bebê mais pra frente – com 38, 39 anos – poderia fazer uma fertilização e engravidar.

Depois de pensar sobre a questão, concordei com o professor e resolvi fazer o congelamento dos óvulos no final da especialização. Na idade em que eu estava, o natural seria produzir cerca de 12, 14 ou 16 óvulos após a estimulação ovariana. Quando você opta por essa técnica e os descongela, há uma perda de 30 a 50%, mas, teoricamente, eu ficaria com 6 ou 8 óvulos que poderiam produzir 6 ou 8 embriões. Então, encarei o tratamento, tomei remédios e injeções para estimular a produção dos óvulos. Só que depois de realizar todo o protocolo de medicação, eu só tive quatro óvulos. Aquela foi uma notícia inesperada, que mexeu muito comigo. Afinal, significava que a minha reserva ovariana não era boa, que se eu resolvesse engravidar depois de oito anos, talvez não conseguisse e poderia sofrer uma falência ovariana e acabar entrando em menopausa precocemente. Como a quantidade de óvulos era pequena, eu não pude congelá-los. Tivemos que fazer desses óvulos, embriões e congelamos quatro embriões para depois pensarmos no que faríamos no futuro.

Todo esse processo mexeu muito comigo. Eu acho que a gente não quer as coisas até o momento em que a possibilidade de ter nos é tirada e aí a gente resolve querer. Depois de uns dois anos que os embriões estavam congelados, eu e o meu marido decidimos engravidar. Tentamos naturalmente por um pouco mais de um ano, mas nada aconteceu. Eu não tinha nenhum diagnóstico da causa da infertilidade, mas como tenho endometriose, julgávamos que esse era o motivo. A partir disso, resolvemos optar pelo método mais básico de reprodução assistida: a inseminação artificial. Estimulamos a ovulação, os espermatozóides do meu marido foram capacitados e fui inseminada. Tive o resultado positivo da gravidez, mas ela não evoluiu. O abortamento foi sofrido porque estávamos comemorando e acreditando que a primeira tentativa tinha dado certo. Mas, apesar do baque, seguimos em frente. Eu optei por não fazer uma nova inseminação e resolvi usar um dos embriões que estavam congelados. Como eu disse, congelamos quatro embriões, sendo 2 deles juntos e 2 deles separados porque eu sempre tive medo de ter uma gestação gemelar. Transferimos pela primeira vez um embrião e o resultado foi negativo, eu não consegui engravidar. Dois meses depois, fizemos um novo ciclo e conseguimos o nosso positivo!

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A gravidez evoluiu de maneira absolutamente tranquila. Eu não tive nenhuma intercorrência no pré-natal, tudo correu bem, os exames estavam normais. Quem iria fazer o meu parto é uma grande amiga, que faz os partos das minhas pacientes comigo. Eu estava tranquila porque queria ter o normal e sabia que a Dra. Nina estava aberta a essa possibilidade e tinha total confiança de que ela faria tudo para que desse certo. Em nenhum momento eu me senti preocupada em relação ao que o meu obstetra iria fazer: será que ele realmente me deixará viver o meu parto normal ou isso será roubado de mim? Eu não tinha a menor preocupação com essa questão e, no fundo, tinha certeza de que o parto normal seria possível, pois o pré-natal correu bem, meu bebê não havia tido nenhuma intercorrência, eu não tive doenças como pressão alta e diabetes ou outro fator que poderia dificultar essa escolha.

A gravidez foi se desenrolando, mas eu ainda não tinha entrado em trabalho de parto nas quarentas semanas, apesar do colo já estar dilatado. Decidimos que deveríamos induzir o trabalho de parto por alguns fatores obstétricos e clínicos. Achamos que a gravidez deveria ser interrompida, mas ela já estava completamente a termo. Então, como eu faço com muitas pacientes, comecei a indução por meio de uma medicação cujo uso é vaginal. Como sou obstetra, eu mesma fiz o procedimento em mim. Comecei em um dia à noite – de quarta para quinta-feira – achando que eu colocaria o primeiro comprimido e começaria a ter contrações. Inclusive, liguei para a minha médica dizendo para ela se preparar porque dali algumas horas eu retornaria. Pura ilusão. Coloquei o primeiro remédio, seis horas depois o segundo, seis horas depois o terceiro, seis horas depois o quarto e nada acontecia. As contrações não apareciam e o colo não dilatava. Optamos por internar na sexta-feira de manhã para tentarmos induzir com outra droga, que dessa vez seria um medicamento venoso aplicado no hospital.

Depois de mais de 36 horas do início da indução, eu internei. O trabalho de parto foi induzido com uma nova droga e eu comecei a ter contrações. A analgesia foi feita, as contrações continuavam, mas o colo não dilatava. Tomamos todas as medidas possíveis para ver se algo acontecia, mas nada ocorreu. Eu sabia que se o trabalho de parto não acontecesse depois de 48 horas do início de indução, o diagnóstico seria o de falha de indução. Não temos uma explicação ou motivo para isso – nem no meu caso ou de outras pacientes. Depois que a gente induz é necessário que o bebê nasça – se não for de parto normal, precisa ser de cesárea. E quando a Dra. Nina chegou a essa conclusão, que eu também já tinha chegado, ela disse que precisaríamos operar. Eu não sei o que se passou na minha cabeça e até hoje eu não entendo bem o que senti naquele momento, mas foi uma mistura de medo da cirurgia – sim, eu estava preocupada porque a cesariana é uma cirurgia de médio/grande porte, mas uma grande sensação de impotência me invadiu, de que nada do que eu fiz adiantou, de que as teorias não funcionaram para mim. Acho que isso foi o mais dolorido: ter feito o que eu sabia, o que a medicina dispõe, ter seguido tudo para ter um parto normal e simplesmente o meu corpo não ter aceitado a indução.

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Eu lembro que fui de cadeira de rodas do quarto para o centro cirúrgico e eu não conseguia parar de chorar. O meu bebê nasceu no hospital onde eu trabalho e todos lá me conheciam: a enfermeira que pegou a minha veia, a técnica de enfermagem que trocou a minha roupa, o anestesista, a obstetra, o pediatra. Mesmo assim, eu só chorava, pois estava muito abalada, me sentindo impotente diante da situação. Todos tentavam me acalmar, mas eu não conseguia ficar tranquila, apesar de ter certeza absoluta de que a conduta certa estava sendo tomada e de que era realmente hora de operar.

A cirurgia começou e eu ainda chorava. Minha família estava na sala: meu marido, minha mãe, minha irmã e meu irmão. Tudo foi feito com muito respeito, carinho e amor. A equipe é muito competente e a favor da humanização do nascimento, então, as coisas aconteceram da melhor maneira possível. Viver tudo isso me faz querer fazer mais a cada parto porque hoje eu sei o quanto humanizar um nascimento deve ser a missão do obstetra, pois a gente fica muito vulnerável. Eu, médica, obstetra, com o pré-natal sem nenhuma intercorrência, me senti fragilizada naquele momento e olha que eu conhecia cada um que estava dentro da sala do centro cirúrgico!

Durante o procedimento, tudo transcorreu de maneira tranquila – exceto a extração do bebê, que não foi fácil, pois a posição da sua cabecinha era muito fora do padrão. Devido a isso, ele nasceu bem molinho e não chorou… Não foi aquele bebê que chegou rosado, ativo, mexendo os bracinhos. Quando a Dra. Nina o trouxe para perto de mim, eu pedi que a pediatra o levasse para que ele fosse reanimado, aquecido, recebesse oxigênio e fosse aspirado – se necessário – porque percebi que o meu filho não estava bem. No momento em que o vi daquele jeito, fiquei desesperada e me senti ainda mais impotente. O Joaquim foi levado pelos médicos e logo chorou. Na verdade, não foi feito nenhum procedimento de assistência de reanimação. Ele somente foi seco e aquecido porque precisou de um tempinho a mais para se encontrar do lado de fora. Todos me falavam que ele estava bem, mas eu continuava chorando. Quando o meu filho voltou, o colocaram pertinho de mim. Eu fiquei ali, vendo-o, cheirando-o até o final da cirurgia e isso acalentou muito o meu coração!

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Em nenhum momento do pós-operatório eu me culpei por não ter conseguido o parto normal. Não me achei menos importante, menos capaz ou menos mãe por isso. Depois da cesárea, tive muita dor nos três primeiros dias e precisei tomar uma medicação potente. Também passei muito aperto para amamentar – com dores físicas e emocionais fortes. Mas, com ajuda, conseguimos passar por essa fase: ele aprendeu a mamar e tudo ficou bem. Acho que eu vivo uma maternidade consciente, mas muito leve. Não sou uma mãe cheia de neuras, assim como também não fui uma grávida cheia de neuras e nem sei por qual motivo eu sofri tanto com a história de não ter conseguido parir. Hoje estou absolutamente bem resolvida com tudo o que aconteceu. Eu e meu marido não planejamos ter mais um filho, mas é claro que tentarei parto normal mais uma vez se eu engravidar.

Acho que as gestantes que querem muito um tipo de parto e acabam não tendo devem tentar internalizar que o parto foi o melhor para aquele momento. Desapeguem, foquem suas energias nos pensamentos bons, esqueçam o que deveria ter sido e não foi, encarem a nova realidade, invistam na maternidade consciente e vivam o que vocês têm hoje. Tudo passa rápido demais e deixará lembranças. Vivam o melhor que vocês podem!”

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