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Depressão pós-parto em tempos de pandemia: como identificar e tratar

Entenda como o isolamento social e a covid-19 podem contribuir para que a condição, comum em mulheres durante o puerpério, fique ainda mais evidente.

Por Ketlyn Araujo
Atualizado em 19 fev 2021, 21h49 - Publicado em 19 fev 2021, 19h47

São diversas as causas de uma depressão pós-parto, doença mais comum entre mulheres que se tornam mães. De acordo com a psiquiatra do Centro de Saúde da Mulher do Hospital e Maternidade Pro Matre, Layla Campagnaro, todas as figuras femininas que passam pelo puerpério correm o risco de sofrer com a depressão pós-parto, que no Brasil tem prevalência de 25%, dados do estudo “Factors associated with Postpartum depressive symptomatology in Brazil: The Birth in Brazil National Research Study“, publicado no periódico científico Journal of Affective Disorders.

Layla explica que a condição pode estar relacionada a fatores biológicos, psicológicos, sociais ou culturais: “Entre os biológicos estão a presença de depressão na família, histórico de depressão pós-parto em puerpérios anteriores, perda perinatal, complicações gestacionais ou maternas, alterações hormonais e vivência negativa do parto”, diz a médica.

Já os fatores psicológicos tendem a estar relacionados com a ideia de um perfeccionismo materno, com expectativas e idealizações referentes à maternidade, além de gravidez não planejada e violência de gênero. No âmbito social, completa a psiquiatra, a principal razão que leva a mulher a sofrer com o transtorno psicológico é a solidão materna, muito mais frequente em meios urbanos, enquanto que o maior fator cultural está no choque entre as necessidades afetivas da mãe e o contato que demanda o recém-nascido.

Isso tudo, vale lembrar, já ocorria em um cenário “normal”, sem a presença de um vírus que dizimou parte significativa da população mundial (e ainda não foi embora). A pandemia, que impactou diretamente a saúde mental de crianças e adultos, também está relacionada a novos casos de depressão pós-parto.

As causas da depressão pós-parto na pandemia

Em escala global, endossa Layla, transtornos psicológicos e psiquiátricos vêm aumentando durante a pandemia, graças ao isolamento e estresse gerados por esse medo de contaminação e de espalhar o vírus para familiares mais vulneráveis.

Para Samantha Nobre, psicóloga do Hospital São Francisco de Mogi Guaçu, muitas das puérperas têm apresentado bastante consciência e responsabilidade com relação ao isolamento social e impossibilidade de receberem visitas durante a pandemia.

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Mesmo assim, isso não torna a fase mais fácil, muito pelo contrário: “Gestantes e puérperas ficam muito angustiadas, e muitas delas relatam terem passado a gestação em isolamento absoluto por medo de contraírem a covid-19. Algumas também sofreram perdas significativas (de pais e mães, por exemplo), o que também tem grande influência nos quadros de depressão e ansiedade”, completa a psicóloga.

Layla concorda ao dizer que o período perinatal já é, por si só, um momento de extremas mudanças físicas, emocionais, familiares e estruturais, e cuja presença de uma rede de apoio ativa é fundamental.

“Com a pandemia ocorreu uma redução da rede de apoio, favorecendo o isolamento, o que pode propiciar a sobrecarga materna e sensação de fadiga. O sentimento de solidão e os múltiplos afazeres diários também corroboram para uma alimentação materna deficitária, bem como para o abandono de atividades físicas ou prazeirosas. Quando conseguem descrever suas emoções, muitas mulheres falam que se sentem fragilizadas, inseguras, amedrontadas, sendo comum o aparecimento de doenças psiquiátricas ou mesmo tornando o quadro mais agudo”, valida.

Sendo assim, estes sentimentos mais frequentes por conta do coronavírus em um período de fragilidade emocional fizeram com que muitas mulheres tivessem que ficar em casa com seus bebês, sobrecarregadas pelas atividades do dia a dia e, muitas vezes, sem ajuda ou possibilidade de grandes distrações, o que levou ao surgimento de doenças psiquiátricas.

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Sinais que o corpo dá

O diagnóstico da depressão pós-parto, com ou sem pandemia, é baseado nos mesmos critérios que se usa para identificar o transtorno psicológico fora do período perinatal, diz a Dra. Layla. Quando falamos sobre mulheres puérperas, a doença pode se manifestar em um período de seis meses (ou, para alguns pesquisadores, até um ano) após o parto.

“O transtorno de humor no puerpério divide-se em quadros leves, chamados de disforia do pós-parto ou puerperal blues (baby blues), fenômeno fisiológico considerado comum, no qual cerca de 85% das puérperas descrevem algum grau de tristeza e humor deprimido nos primeiros dias do pós-parto, incidência que tende a diminuir a partir do décimo dia”, explica Samantha. Sentimentos como irritabilidade, tensão e inadequação, sem que comprometam a relação mãe-bebê, também podem aparecer logo de início, mas neste caso costumam desaparecer de forma espontânea.

Já a depressão pós-parto costuma vir acompanhada por alguns sinais e sintomas mais evidentes e persistentes, o que demanda avaliação médica e tratamento psicológico e psiquiátrico. Alguns desses sintomas podem estar relacionados a: perda de interesse em atividades que antes eram prazeirosas, falta de energia, alterações no sono (dormir muito, pouco ou não conseguir descansar, nem quando o bebê está dormindo), ansiedade constante, culpa, distanciamento de familiares e amigos antes próximos, mudanças nos hábitos alimentares (comer muito ou pouco), dificuldades de concentração, choro constante e humor instável, pensar em fazer algum dano em si mesma ou no bebê, bem como temer o próprio filho/a.

Diagnóstico e tratamento

As especialistas reforçam que a depressão pós-parto é capaz de gerar múltiplos prejuízos na qualidade de vida da mãe, além de impactar diretamente na interação com o bebê, o que se manifesta na alimentação, no desenvolvimento da criança e intensifica conflitos dentro de casa.

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O primeiro passo, portanto, é procurar um psiquiatra perinatal, profissional capaz de realizar o diagnóstico correto, avaliando a gravidade do caso e seus riscos, além de traçar um plano terapêutico junto com a paciente, envolvendo ou não a introdução de medicamento. Vale lembrar, ainda, que o acompanhamento deve ser feito de maneira conjunta, ou seja, um tratamento médico e medicamentoso não exclui a necessidade de terapia, e vice-versa.

Para conseguir lidar com tudo isso em meio à pandemia, Layla recomenda que mães diagnosticadas com depressão pós-parto neste período façam bom uso da tecnologia. “Hoje existem muitos grupos online de apoio e troca entre mães ou amigas ‘recém-paridas’, que são importantes aliados tanto para a prevenção da depressão pós-parto, quanto para auxiliar no tratamento e recuperação destas mulheres”, diz a psiquiatra.

Além disso, pode-se recorrer a consultas psicológicas online, auxílio nutricional e prática de exercícios físicos remotamente, o que também contribui para uma evolução positiva do quadro. É importante, ainda, que a mãe possa ter, na medida do possível, momentos de individualidade sem o bebê, como usar esse tempo para dormir e descansar, ou dar uma volta no parque ou na quadra do prédio (com segurança). O objetivo é investir em atividades que lhe proporcionem prazer!

Papel do parceiro/a e da rede de apoio

Apesar das dificuldades, a pandemia, por conta da necessidade de ficar em casa e implementação do trabalho remoto em muitas empresas, trouxe a possibilidade de maior contato e convivência entre parceiros (as) e suas companheiras que acabaram de dar à luz, bem como com os próprios bebês. Isso foi capaz de unir muitas famílias, aponta Samantha, e é essencial que não somente os companheiros, mas também todos aqueles que fazem parte da rede de apoio da puérpera, fiquem em alerta para possíveis sintomas e características da depressão pós-parto neste cenário.

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Observar os sinais que essa mulher apresenta, não julgá-la e não relutar em buscar ajuda são comportamentos essenciais. “Quando o companheiro, algum familiar ou amigo identificar uma mulher que possa estar passando por uma vivência depressiva no pós-parto, é importante primeiramente acolhê-la – e não criticar. Ele deve conversar com ela, mostrando que estão juntos nesse processo, e sugerir que podem e devem procurar ajuda psiquiátrica”, ensina Layla, ao constatar que, devido a um estigma social muito forte, estas mulheres (e até os próprios familiares) tendem a não pedir por ajuda.

Lembre-se de que a depressão pós-parto, quando diagnosticada, tem tratamento e grandes chances de cura. E vale lembrar que, mesmo quando há necessidade de uso de medicamentos, a mulher pode manter a amamentação normalmente. “Entretanto, se ela não receber o tratamento adequado, a sua depressão pode se tornar crônica e seu sofrimento mental pode aumentar exponencialmente. Vale alertar que o suicídio é a principal causa de morte materna no pós-parto”, finaliza a psiquiatra.

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