Você já ouviu falar em Covid longa? O termo, usado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), faz referência aos sintomas tardios da doença causada pelo coronavírus. São aqueles que podem continuar, voltar ou até aparecer meses depois da infecção. “São os efeitos a longo prazo que a doença pode causar, sintomas que persistem por mais de 12 semanas e não são explicados por um diagnóstico alternativo além da Covid”, explica o pediatra Paulo Telles, da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
Um estudo desenvolvido pela Fiocruz Minas avaliou os efeitos da doença, concluindo que as sequelas podem seguir por mais de um ano. Na pesquisa, 646 pacientes adultos foram acompanhados por 14 meses e, desse total, 50,2% tiveram sintomas no pós-infecção.
Entre eles, a fadiga se mostra como o mais frequente, seguido por tosse persistente, dificuldade para respirar, perda do olfato ou paladar e dores de cabeça. Insônia, ansiedade e tontura também chamaram a atenção. Quando são observados sintomas mais graves, a trombose aparece em 6,2% do grupo monitorado.
Covid em crianças
É importante lembrar que, desde o início da pandemia, as crianças formaram o grupo menos estudado pela ciência, já que elas apresentavam menos risco de complicações graves. Ainda assim, não quer dizer que as chances não existam. Ainda segundo Paulo Telles, há duas questões principais da Covid entre os pequenos. “A primeira é a SIMP, Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica, que pode acontecer de duas e seis semanas após a infecção aguda, causada por uma resposta imunomediada, com taxa de gravidade e óbito altas. A segunda é justamente a Covid longa”, conta o pediatra.
Telles salienta, porém, que a grande maioria das infecções em crianças são leves ou assintomáticas, e que esses efeitos persistentes ou tardios não são comuns. Ou seja, não é preciso fazer exames de controle no pós-Covid; basta ter atenção ao comportamento dos pequenos.
Como a Covid longa se manifesta em crianças?
Os estudos sobre os sintomas tardios da doença ainda estão em curso, afinal, é preciso acompanhar as pessoas infectadas por meses após o término da infecção. Por isso, as pesquisas que se debruçam sobre casos infantis são ainda mais restritas, mas um estudo pré-publicado no MedRxiv – site que traz artigos científicos ainda não revisado por pares, ou seja, com status preliminar – aponta que 25% das crianças e adolescentes infectados pelo Sars-CoV-2 desenvolveram a Covid longa.
O estudo foi conduzido por universidades dos EUA, México e Suécia e concluiu que as manifestações mais comuns entre crianças e adolescentes foram sintomas de humor (tensão, ansiedade e depressão), fadiga, distúrbios do sono, dor de cabeça, problemas respiratórios e sintomas cognitivos.
Paulo Telles pondera, porém, que os poucos estudos sobre a Covid longa em crianças ainda são incipientes e apresentam estimativas que variam de 2% a 27% – ou seja, ainda há muito a ser investigado e revisado.
Quando procurar orientação médica
Na prática clínica, outros sintomas além desses já mencionados também foram notados, como explica Ana Karolina Barreto Marinho, especialista em Alergia e Imunologia e membro do Departamento Científico de Imunização da ASBAI – Associação Brasileira de Alergia e Imunologia. “Tem sido observado em crianças sintomas persistentes como dor nas articulações, erupções na pele e palpitações cardíacas”, afirma a médica.
Mas, afinal, como saber se o seu filho tem um problema decorrente da Covid? É difícil estabelecer isso de forma definitiva, mas vale ficar atento ao comportamento dos pequenos após a doença. “Caso a criança persista indisposta após passado o período de infecção aguda, não queira brincar e se movimentar como antes e/ou apresente sintomas visíveis, como falta de ar, machas na pele e outros, a orientação é procurar o pediatra ou o serviço de saúde”, explica a especialista.
Saúde mental infantil pós-Covid
Entre todos esses fatores, a saúde mental dos pequenos tem chamado a atenção. Ainda assim, é muito difícil avaliar se questões como depressão, ansiedade, falta de concentração e dificuldades de socialização são em decorrência da doença em si ou do longo período de isolamento e todas as suas consequências.
O neurocirurgião pediátrico Ricardo Santos de Oliveira, porém, pontua que muitos sintomas podem estar relacionados a alterações disautonômicas (que desequilibram ações involuntárias, como a reação do corpo em uma situação de estresse). “A disautonomia é uma disfunção do sistema simpático e parassimpático. Ainda não está claro se a disautonomia pode ser causada pelo efeito direto do Sars-CoV-2 ou ser um efeito secundário à resposta imunológica e inflamatória”, explica.
Oliveira destaca, por fim, a necessidade de se fazer mais pesquisas direcionadas às crianças. “Novos estudos clínicos trarão informações mais significativas acerca do impacto da pandemia nesse grupo etário”, finaliza.
Por ora, vale lembrar a importância da vacinação. No Brasil, a imunização contra a Covid-19 está disponível para crianças a partir de 5 anos e ajuda a salvar vidas. Essa é, sem dúvidas, a melhor forma de evitar ou minimizar qualquer sintoma da doença.